O avanço das apostas eletrônicas — impulsionadas pelas chamadas bets — tem provocado prejuízos financeiros, emocionais e de saúde mental a milhares de brasileiros. Diante do aumento dos casos de dependência, os ministérios da Saúde e da Fazenda lançaram um pacote de ações voltado para a prevenção do vício e para o atendimento de usuários em situação de risco.
As medidas foram formalizadas em um acordo de cooperação técnica, assinado nesta quarta-feira (3) pelo ministro da Saúde, Alexandre Padilha, e pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Entre as ferramentas previstas está uma plataforma de autoexclusão, que será lançada em 10 de dezembro. Com ela, qualquer apostador poderá solicitar o bloqueio do próprio CPF para impedir novos cadastros, acesso aos sites e até o recebimento de publicidade das casas de apostas.
Um estudo citado pelo governo aponta que as bets geram perdas econômicas e sociais estimadas em R$ 38,8 bilhões por ano no país.
Observatório e monitoramento
O acordo também cria o Observatório Brasil Saúde e Apostas Eletrônicas, que funcionará como um canal permanente de troca de dados entre as pastas. O objetivo é identificar padrões de compulsão e acionar equipes de apoio para facilitar o vínculo dos usuários com serviços do Sistema Único de Saúde (SUS).
“Com esses dados, vamos identificar padrões de adição e localizar essas pessoas para que nossas equipes possam entrar em contato e servir de ombro amigo”, explicou Padilha.
Ferramentas de apoio
Além da autoexclusão, o governo vai divulgar orientações sobre como buscar ajuda na rede pública, com informações disponíveis no aplicativo Meu SUS Digital e na Ouvidoria do SUS.
Foi lançada também a Linha de Cuidado para Pessoas com Problemas Relacionados a Jogos de Apostas, que inclui diretrizes clínicas e prevê atendimento presencial e online para reduzir barreiras de acesso ao tratamento em saúde mental.
A partir de fevereiro de 2026, o SUS passará a oferecer teleatendimento em saúde mental focado em jogos e apostas, em parceria com o Hospital Sírio-Libanês. Serão 450 atendimentos mensais, com possibilidade de expansão conforme a procura.
“Esse atendimento será integrado à rede SUS e, quando necessário, o paciente será direcionado para o serviço presencial”, informou o ministério.
Regramento das apostas
Durante o evento, Haddad afirmou que quase nada foi feito entre 2019 e 2022 para regulamentar o setor das bets, apesar de a modalidade ter sido autorizada em 2018.
“O país precisava de regras de tributação, limites de propaganda e parâmetros de jogo responsável. Nada disso avançou”, disse o ministro.
Ele destacou ainda que, com as novas regras, CPFs de crianças, beneficiários do BPC ou do Bolsa Família não podem ser usados para cadastro em sites de apostas.
Crescimento dos transtornos
Segundo o diretor do Departamento de Saúde Mental do Ministério da Saúde, Marcelo Kimati, o número de atendimentos relacionados à compulsão por jogos tem crescido no SUS. Foram 2.262 atendimentos em 2023, 3.490 em 2024 e 1.951 apenas entre janeiro e junho de 2025.
Kimati afirmou que já é possível identificar um perfil predominante entre os dependentes:
“Homem, entre 18 e 35 anos, negro, vivendo situações de estresse, ruptura de rotina, desemprego, separação ou isolamento social. Em resumo, pessoas em forte situação de vulnerabilidade.”
