Uma investigação detalhada do jornal O GLOBO trouxe à tona o uso controverso de uma emenda parlamentar no valor de R$ 1,25 milhão destinada ao município de Arari, no Maranhão. A verba, indicada pelo deputado federal Pedro Lucas Fernandes (União) para a recuperação de estradas vicinais, foi repassada via Emenda Pix em agosto de 2023, mas seu destino final é, até o momento, desconhecido.
O caso se tornou um dos exemplos de falha de transparência e controle na utilização da modalidade Emenda Pix em âmbito nacional.
Desvio de Finalidade e Contas Zeradas
O dinheiro foi transferido em agosto de 2023, ainda na gestão do ex-prefeito Rui Filho (União Brasil). No entanto, a prefeita que o sucedeu, Maria Alves Muniz (MDB), conhecida como Simplesmente Maria, afirmou ter encontrado as contas zeradas e que o montante não foi aplicado nas obras rodoviárias previstas.
“Esse valor simplesmente desapareceu. Não foi para obra nenhuma”, declarou a atual gestora.
Documentos enviados pelo ex-prefeito à Controladoria-Geral da União (CGU) indicam que o montante foi distribuído em transferências bancárias realizadas entre 1º e 5 de setembro de 2023, sendo pulverizado em quatro contas da prefeitura e misturado a outros recursos, o que dificultou o rastreamento, segundo a reportagem.
O Custeio Proibido e Empresas Suspeitas
O ex-prefeito Rui Filho defendeu-se alegando que as Emendas Pix eram usadas no custeio da prefeitura, citando despesas como transporte de lixo, medicamentos e, inclusive, pagamento da folha de servidores. A reportagem ressalta que o uso de emendas parlamentares para pagar salários é vedado pela Constituição. Ele também citou um redirecionamento emergencial devido a enchentes, mas as cheias teriam ocorrido meses antes dos pagamentos.
A apuração do GLOBO revelou que o valor da emenda foi transferido a 11 empresas em sequência. Entre os beneficiários estavam:
- Um posto de gasolina.
- Um lava-jato.
- Uma loja de artigos esportivos registrada em nome de uma beneficiária do programa Bolsa Família, que negou ter recebido qualquer valor.
Ao verificar os endereços, a reportagem constatou que algumas empresas não funcionavam ou não apresentaram comprovação de serviços prestados ao município.
O Posicionamento dos Envolvidos
O deputado federal Pedro Lucas Fernandes, autor da indicação do repasse, afirmou desconhecer o destino dos R$ 1,25 milhão e transferiu a responsabilidade pela aplicação do recurso ao ex-gestor: “Confesso que desconheço para onde foi a emenda. O gestor tem que dizer onde está aplicando. Acho natural que tenha uma explicação”, disse o parlamentar.
Repercussão Federal e STF
O caso de Arari se junta a uma série de denúncias que colocaram o mecanismo de repasse direto via Emendas Pix no centro da crise política e judicial.
Diante do cenário de falta de controle e transparência, o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou o bloqueio e a apuração de mais de R$ 30 bilhões em repasses sem vinculação específica a projetos. O STF encaminhou especificamente o caso de Arari à Procuradoria-Geral da República (PGR) para avaliação e possível abertura de investigação.