O transplante de medula óssea — também chamado de transplante de células-tronco hematopoiéticas — é indicado para o tratamento de doenças que comprometem a produção do sangue, como leucemias, aplasias, imunodeficiências e algumas doenças genéticas.
Segundo levantamento da Sociedade Brasileira de Transplante de Medula Óssea (julho/2025), 2.679 pessoas aguardam por transplante no Brasil, sendo 948 para transplantes alogênicos (quando as células são doadas por outra pessoa) e 1.731 para transplantes autólogos (realizados com células do próprio paciente). O Hospital Universitário da UFMA (HU-UFMA) está entre os centros da Rede Ebserh que integram esse esforço nacional, ampliando a capacidade técnica, estruturando equipes e garantindo acesso a esse tratamento de alta complexidade pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Em 2025, o HU-UFMA alcançou um marco histórico ao realizar seus primeiros transplantes de medula óssea autólogos pelo SUS.
O hematologista e responsável técnico da Unidade de Hematologia e Hemoterapia, Yuri Nassar, destaca que, até então, os pacientes maranhenses precisavam se deslocar para outros estados para realizar o procedimento. “Hoje, conseguimos oferecer no Maranhão uma terapia de alta complexidade que antes não estava disponível aqui. É um passo gigantesco para o estado”, afirma.
Um novo recomeço
O transplante autólogo utiliza as células do próprio paciente após uma quimioterapia de alta intensidade, com o objetivo de tratar a doença de base. O aposentado, com planos de voltar à ativa, Francisco Lopes Neto, de 64 anos, costuma dizer que tem duas datas de aniversário: 18 de junho, quando nasceu, e 5 de novembro, quando renasceu — o dia em que sua medula “pegou”.
Após enfrentar dores por dois anos e receber diagnósticos incorretos, Francisco descobriu o mieloma múltiplo. Estava prestes a viajar para Recife para realizar o transplante quando soube que o HU-UFMA havia sido credenciado para o procedimento. “Foi uma emoção ver a medula toda rosinha voltando para mim. Tiraram a doença do meu corpo”, relembra, emocionado.
O transplante ocorreu em outubro de 2025. Ele permaneceu 21 dias em isolamento — um período difícil, mas decisivo para o sucesso do tratamento. “O que cura não são só os remédios. É o amor com que somos tratados. O hospital funciona por causa de cada profissional”, destaca. Atualmente, Francisco segue em acompanhamento semanal e apresenta boa evolução clínica.
O hematologista Yuri Nassar explica que o transplante de medula óssea alogênico ainda enfrenta um dos maiores desafios da área: encontrar um doador compatível fora do núcleo familiar. “A chance de compatibilidade das células, relacionadas ao sistema HLA (antígeno leucocitário humano), é de apenas 1 a cada 100 mil”, ressalta.
Apesar disso, o Brasil conta com o terceiro maior banco de doadores do mundo, o Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome), que reúne cerca de seis milhões de pessoas cadastradas, aumentando significativamente as chances de encontrar um doador não aparentado.
O especialista também destaca os avanços nos transplantes de medula óssea haploidênticos — realizados com doadores que possuem apenas 50% de compatibilidade HLA. “Esse progresso foi possível, principalmente, graças ao desenvolvimento de novos imunossupressores e ao melhor entendimento do uso dessas drogas no manejo do paciente transplantado, reduzindo o risco de rejeição”, explica.
Histórias como a de Francisco mostram que, por trás das técnicas e protocolos, existe algo fundamental: a possibilidade real de recomeçar. Neste contexto, o tema ganha ainda mais relevância durante a Semana de Mobilização Nacional para Doação de Medula Óssea, realizada anualmente entre os dias 14 e 21 de dezembro, período dedicado à conscientização sobre a importância do cadastro de novos doadores.
Para se cadastrar como doador voluntário, basta procurar o hemocentro mais próximo, ter entre 18 e 35 anos e estar em bom estado geral de saúde. Mais informações estão disponíveis no site do Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (Redome). “Você pode ser a única chance de alguém que está precisando dessa terapia”, finaliza Yuri.
