O Supremo Tribunal Federal (STF) se prepara para um novo capítulo de um dos processos mais sensíveis da história recente: o julgamento do chamado Núcleo 4 da Trama Golpista, e o cenário não poderia ser mais emblemático. O caso será o primeiro a ser conduzido pelo ministro Flávio Dino à frente da presidência da Primeira Turma, cargo que assumiu no início de outubro.

A movimentação da Primeira Turma, responsável por analisar ações penais de alta complexidade desde o final de 2023, adquire um peso simbólico. O colegiado, que tem em sua composição ministros como Alexandre de Moraes (o relator do caso), Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin, será o palco para a análise de um grupo acusado pela Procuradoria-Geral da República (PGR) de atuar em “operações estratégicas de desinformação”.

A Arquitetura da Denúncia

O cerne da denúncia da PGR é que os sete réus do Núcleo 4, composto por ex-militares e um ex-agente da Abin e da Polícia Federal, não apenas espalharam notícias falsas sobre o processo eleitoral e atacaram autoridades e instituições, mas o fizeram cientes de um “plano maior” para gerar instabilidade social e “tentar romper a ordem institucional”.

Os crimes imputados são de extrema gravidade e remetem diretamente à proteção do Estado Democrático de Direito e do governo legitimamente constituído: abolição violenta do Estado Democrático de Direito (pena de 4 a 8 anos), golpe de Estado (pena de 4 a 12 anos), e organização criminosa (pena de 3 a 8 anos), além de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

A Lente Política sobre o Judiciário

Para além dos autos, a condução do caso por Dino — um ex-governador e ex-ministro de Estado que acabou de assumir o comando da Turma — injeta uma camada adicional de análise política no julgamento. A Corte, já há algum tempo, está sob intensa escrutínio público e político, com setores da sociedade e da oposição frequentemente questionando sua imparcialidade em casos de alta voltagem.

O julgamento, marcado para começar na terça-feira (14), servirá como um termômetro para a atuação da Primeira Turma no avanço de processos que miram a desestabilização institucional. É um momento em que a liturgia da toga se choca com a política mais crua. A decisão do colegiado não será apenas uma leitura da lei penal, mas um recado eloquente sobre os limites que o Estado brasileiro, através de seu poder Judiciário, está disposto a impor aos atos que desafiam a estrutura da democracia.

Com outros núcleos da trama (como o Núcleo 2, de gerenciamento, e o Núcleos 3, de ações coercitivas) também em fase final de tramitação, o veredito sobre o “núcleo de desinformação” se consolida como o primeiro grande teste da nova liderança da Turma e um marco na jurisprudência brasileira sobre o combate à radicalização política. O país observa, ciente de que cada voto ali proferido será interpretado também no campo da história política.